Caminho das Águas
Tenho me notado mais sensível nos últimos dias, mais conectada com músicas, imagens, falas que me tocam. Ao mesmo tempo, estava com dificuldade de escolher algum tema específico para falar no blog de hoje. Então resolvi falar sobre esse processo de abertura de forma geral. A abertura, desde o meu ponto de vista, se refere a esse processo de se abrir para as nossas experiências da forma como elas aparecem. Falando assim, pode parecer fácil, mas na prática não é bem assim… Numa época em que as perdas, tristezas, lutos e incertezas estão tão presentes, nos abrirmos para o que estamos sentindo é muito doloroso.
Por que fazer isso então? Não é minha intenção dar uma resposta aqui, cada um deve fazer sua escolha conforme suas necessidades no momento. Então vou apenas compartilhar a minha experiência de abertura e do sentido que ela tem tido para mim. Caso faça sentido para você, fica o convite para fazer essa experiência também.
A pandemia nos trouxe um novo contexto, com novas experiências e também novas dores. Durante esse período, por vários momentos me percebi anestesiada, apenas vivendo, sem estar conectada com o que eu estava fazendo, com a minha vida. Faz sentido. É uma estratégia do nosso corpo para sobreviver a experiências difíceis. Ao mesmo tempo, ficar presa nessa estratégia foi diminuindo a minha vitalidade, me tornando mais apática, me tirando o sentido de estar aqui.
Então fiz um compromisso comigo mesma, me abrir para o que eu estava sentindo, sem medo. Esse compromisso não foi do dia para a noite, foi um processo, mas fui me entregando para ele. É como a água que flui naturalmente, independente da nossa vontade. Você já tentou segurar uma onda? Ou parar o fluxo do rio com as suas mãos? Não funciona, apesar de dar a falsa impressão de que estamos fazendo algo para controlar a situação. Então a alternativa é mergulhar, boiar, deixar que o rio siga o seu fluxo e que nos leve junto, sem lutar contra o fluxo, mas treinando a suave arte de se entregar ao fluxo do rio.
Como eu fui fazendo isso? Me permitindo sentir o que eu estava sentindo, quando estava com medo, me permitindo reconhecer a presença do medo, deixar ele estar ali da forma como ele estava (com a tensão no corpo, aperto no peito, respiração mais ofegante, pensamentos catastróficos). Sem tentar fazer o medo ir embora, ou tentar me convencer de que ele não fazia sentido. Não é fácil fazer isso. Mas essa experiência foi resgatando a minha vitalidade, o meu sentido de viver. Porque esta abertura me permite chorar quando eu sinto tristeza, rir quando eu sinto alegria, amar quando eu sinto amor, sofrer quando sinto medo. Me permite sentir tudo. E entre escolher não sentir nada e sentir tudo, eu escolho mil vezes sentir tudo. Como diria o Rei Roberto Carlos: “se chorei ou se sorri, o importante é que emoções eu vivi”. A água flui naturalmente e eu me entrego ao fluxo dela para onde ela me levar.