Faculdade do Cefi

Temas Atuais

Uma vez... Orgulho e Afirmações

 

“Haviam se passado muitos anos desde que saiu da cidade onde nasceu e se criou. Criou-se até o momento de criar força para sair. Talvez até não tivesse todo o preparo para viver em outro lugar muito longe, mas assim precisava. Naquele tempo não era muito fácil falar com qualquer pessoa a qualquer tempo, e nem muito barato.Mas, ele precisava saber. Ela havia chegado há pouco, depois de uma viagem longa e cansativa. ‘Só vim por você’, ela disse com carinho e como quem pede para ser colada ao peito e recebesse nos ouvidos e na pele que ele estava ali, que era o mesmo filho de quem se despedira um dia e que chorou quando foi embora. Mesmo assim ele precisava saber. Não teve coragem de falar nem no primeiro dia, nem no dia seguinte e mesmo assim precisava saber. Nunca haviam falado sobre isto. Em uma conversa sobre a vida, em um dos momentos de proximidade, entre uma coisa e outra, depois de dormir e acordar com a dúvida, ele ainda queria saber e perguntou: ‘Mãe, o que aconteceu que eu e meus irmãos nos afastamos? É porque sou quem sou?’. Finalmente conseguiu. Ela não precisava de muito para saber do que ele estava falando. Dizem que mãe sempre sabe, mas filho não é tão inteligente assim. ‘Uma vez seu pai perguntou para eles se sabiam que você vive com um homem. Sabe o que eles disseram? Que você tem o direito de viver e ser quem você quiser. Eles têm muito orgulho de você’. Ele sentiu aquilo que ela queria ter sentido quando se reencontraram. Aquilo que era aparentemente simples fez com que ele pudesse sentir-se colado no peito dela e teve a certeza que ele continuava sendo o filho que um dia chorou e sorriu quando foi embora”.

 

Fica muito mais fácil falar em orgulho quando estamos colados ao peito e com a certeza da segurança e da afirmação. “Eu amo você pelo que você é”, disse a mãe.  Falar em orgulho é construir forças, reconhecimentos. É não se sentir estranho apenas por ser quem é quando alguém passa e olha de forma desconfiada como se algo não estive “certo” ali. Falar em orgulho é contruir competências. Nos Estados Unidos e agora em Portugal, em contato com pessoas inspiradoras, também tenho aguçado a inspiração para a prática competente com pessoas. Em pesquisas, aulas, reuniões, congressos... mídia, propagandas, políticas... grupos de whatsapp... em casa, família e amigos... precisamos de competências de todos os lados. Ser amigável não é suficiente se desejamos viver em uma sociedade não fascista, fazendo um “contato” com Foucault no seu texto “Introdução à vida não-fascista”.Necessitamos de competências. É por ela, por exemplo, que nos é possível perceber a LGBTQIA+fobia cordial. São pessoas lesbofóbicas, homofóbicas, bifóbicas, transfóbicas e etc. que são aparentemente amigáveis, porém o exercício não é do respeito, nem da inclusão. São pessoas, que se baseiamem fantasias sociais, em discursos raivosos e assim utilizam dogmas como armas que intensificam o preconceito e o estigma. E ainda, exercemnão só as agressões, mais fáceis de perceber, mas também microagressões, aquelas que aparecem de forma indireta ou subliminar, nos seus discursos, saberes e fazeres.

 

Esta competência, confirmada sua importância em muitas pesquisas em diversos lugares do mundo,é aquela que possibilitaa discussão sobre grupos populacionais com diferenças nas suas necessidades, propagando a diminuição dos estigmas e dos preconceitos. Esta competência é aquela que reforça a afirmação, que se relaciona com a aceitação e a validação de sermos quem somos. Que facilita a comunicação, o respeito e a inclusão. Que nos convida a visitar nossos próprios preconceitos. Ela está no nosso dia-a-dia, na educação das crianças, nos nossos trabalhos, nas nossas relações íntimas. Pois, a categoria “humanidade” não é dada, é conquistada. E uma vez exercida, propaga-se a certeza, o serviço, a aproximação e a paz, que resulta em Orgulho e Afirmações.

 

João Alves

www.joaoalves.com.br