O INVERNO E A DESREGULAÇÃO EMOCIONAL
Costumo pensar no impacto que as estações do ano possuem na desregulação emocional ou nos transtornos de humor. Moro no Rio Grande do Sul, em Porto Alegre e estamos passando por um rigoroso inverno, de muito frio e baixas temperaturas. Ainda com olhar de uma terapeuta comportamental contextual, que embasa sua atuação com foco no contexto, fiquei me questionando, de forma curiosa, sobre os fatores de vulnerabilidade num processo de desregulação emocional, tendo o frio e seus efeitos, como um elo importante dessa cadeia de “comportamentos problema”. E como usar habilidades da DBT para diminuir a intensidade emocional e possíveis crises nesse período?
Cheguei à conclusão que o inverno, com seus dias mais curtos, menor exposição à luz solar, temperaturas mais baixas e mudanças na rotina, pode sim ter um impacto significativo sobre o equilíbrio emocional. Para muitas pessoas — especialmente aquelas que já enfrentam dificuldades com desregulação emocional — esse período do ano pode intensificar sentimento de tristeza, irritabilidade, isolamento e apatia. Esses efeitos não são apenas psicológicos: há também alterações neuroquímicas envolvidas, como a redução da serotonina e da dopamina, neurotransmissores ligados ao bem-estar e à motivação.
Além disso, o inverno pode limitar atividades que promovem saúde emocional, como o contato com a natureza, exercícios ao ar livre e encontros sociais, o que agrava o risco de retraimento e desesperança. Para quem lida com transtornos de personalidade, depressão ou ansiedade, o inverno pode ser um gatilho para crises emocionais, impulsividade, autocrítica severa ou comportamentos de evitação.
Nesse contexto, as habilidades da Terapia Comportamental Dialética (DBT) se tornam ferramentas essenciais para navegar emocionalmente pelos desafios do inverno.
Como as habilidades da DBT podem ajudar:
- Mindfulness – Estar presente mesmo no desconforto: Praticar a atenção plena ajuda a sair do “piloto automático negativo” que muitas vezes se intensifica nos meses frios. Observar os pensamentos sem julgamento, reconhecer emoções difíceis como passageiras e cultivar pequenos momentos de prazer (como tomar uma bebida quente, um chimarrão, saborear uma bergamota/tangerina ou ouvir música) pode fazer uma grande diferença.
- Regulação Emocional – Cuidar do corpo para cuidar da mente: A DBT nos ensina que emoções intensas estão muitas vezes ligadas a fatores biológicos. Dormir bem, alimentar-se de forma equilibrada, manter uma rotina de autocuidado e, se possível, fazer alguma atividade física (mesmo dentro de casa) são formas de manter o sistema emocional mais estável. A habilidade “Manter-se fisicamente saudável” é ainda mais crítica no inverno.
- Tolerância ao Mal-Estar – Suportar a dor sem piorar: Em momentos de crise emocional, pode ser tentador ceder a comportamentos impulsivos. A DBT oferece estratégias de enfrentamento, como o uso de estímulos sensoriais e fisiológicos (como segurar um cubo de gelo ou tomar banho quente), distração saudável (ver filmes, ler livros, pesquisar arte, tomar um café com amigos) e atividades que melhorem o momento (como se enrolar em um cobertor, acariciar seu pet, fazer uma oração, uma massagem ou acender uma vela perfumada).
- Efetividade Interpessoal – Manter vínculos mesmo quando tudo convida ao isolamento: O inverno pode nos tornar mais reclusos. Manter contato com amigos, familiares ou terapeuta, mesmo que virtualmente, é essencial. Usar habilidades de pedido assertivo e manutenção de relacionamentos pode prevenir sentimentos de solidão ou rejeição. Procurar os amigos, marcar encontros em locais quentinhos, desfrutar da culinária do inverno com pessoas que tragam acolhimento.
- Aceitação Radical – Reconhecer o que não pode ser mudado: Aceitar que o inverno tem suas dificuldades e efeitos em nosso estado emocional — e que isso não é sinal de fracasso ou fraqueza — é um passo importante. A aceitação radical não significa gostar da situação, mas sim parar de lutar contra a realidade para poupar energia física e emocional. Focar no que está ao seu alcance fazer ou simplesmente notar a dificuldade e acolhê-la.
Enfim, o inverno é uma estação de recolhimento, mas não precisa ser de sofrimento. Com o uso consciente das habilidades da DBT, é possível passar por esse período com mais equilíbrio, autocompaixão e escolhas sábias. Aprender a cuidar da emoção no inverno é, também, uma forma de florescer na primavera.
Este texto é de autoria do membro da equipe CEFI Contextus - Vanessa Stechow